Para cuidar de louco, só outro louco.
Na década de 1990,
os armazéns externos do Porto de Santos estavam passando por grandes
transformações. Várias empreiteiras encontravam-se instaladas na área,
utilizando contêineres como almoxarifados.
Naquele tempo, o
porto geralmente não operava aos domingos e havia praticamente apenas a Guarda
Portuária em serviço. O policiamento contava com 12 viaturas para cobrir toda a
área portuária, que era dividida em quatro subsedes — três na Margem Direita e
uma na Margem Esquerda do porto.
Cada subsede possuía
a ronda do inspetor e a ronda auxiliar, que atuava somente na sua área de
abrangência. Além disso, havia a ronda do inspetor II, responsável por toda a
operação do turno, e duas rondas gerais, que circulavam livremente por toda a
área portuária.
Uma dessas rondas
gerais tinha como motorista o GP Luizão, guarda experiente, moreno, alto,
forte, zagueiro do time da Guarda e com muita vivência da área do cais. Como
reforço, estava o GP Roberto, com pouco tempo de casa e iniciando na atuação em
serviço de viatura.
Numa tarde de
domingo, enquanto patrulhavam a área dos armazéns externos, Luizão avistou de
longe um indivíduo carregando uma sacola e comentou com o seu parceiro de
viatura:
— Vamos abordar
aquele elemento, está me parecendo meio suspeito.
De imediato, a
viatura encostou e o suspeito foi abordado. Dentro da sacola havia várias
ferramentas. Como naquela área vinham ocorrendo furtos nos almoxarifados das
empreiteiras, o homem foi encaminhado à Sede da Guarda Portuária e apresentado
ao inspetor II Moraes. Esse era o procedimento padrão na época, já que era
necessário localizar a vítima para confirmar que o material encontrado era
produto de furto.
Na Sede da Guarda,
após tomar ciência dos fatos, foram contatadas as empreiteiras, e descobriu-se
que uma delas havia sido furtada naquela tarde. Diante disso, Moraes determinou
que Luizão e Roberto conduzissem o suspeito à delegacia para ser apresentado à
autoridade competente.
Desde que chegou a
sede da Guarda, o homem permanecia sentado em uma cadeira, sem pronunciar uma
só palavra e sem sequer mover os olhos. Ao ser solicitado que acompanhasse os
guardas até a delegacia, manteve-se imóvel. Nesse momento, alguém gritou:
— Leve ele aos
costumes!
Moraes refletiu e,
para evitar problemas, decidiu agir com cautela. Usando de sua experiência,
disse:
— Está me parecendo
um caso de Código 13. Para cuidar de louco, só outro louco. Chamem o GP Félix
para comparecer aqui.
Assim que Félix
chegou, Moraes explicou:
— Esse elemento não
quer acompanhar os colegas até a delegacia. Em vez de usar a força, achei
melhor recorrer à psicologia, e você é a pessoa mais preparada entre nós para
lidar com isso.
Félix, orgulhoso da
missão que lhe fora dada, posicionou-se diante do suspeito e gritou:
— Soldado, sentido!
De imediato, o homem
se levantou. Félix prosseguiu:
— Soldado, marche!
O suspeito então passou
a marchar atrás de Félix até a porta da viatura. Em seguida, recebeu outra
ordem:
— Soldado, entre na
viatura!
Ele obedeceu
prontamente e entrou no veículo — um Gol branco. Enquanto Félix era
cumprimentado por Moraes pela missão cumprida, o suspeito saiu rapidamente pela
porta do outro lado, atravessou a avenida em direção ao heliponto e escapou,
saindo por um pequeno portão existente no muro que dava acesso à Avenida Rodrigues
Alves, tomando rumo ignorado para à área externa do porto.
Em seguida, Moraes
determinou imediatamente que todas as viaturas realizassem diligências nas
proximidades, mas o homem não foi localizado e nunca mais foi visto na área
portuária. Restou a Moraes determinar que as ferramentas apreendidas fossem
devolvidas ao representante da empresa vítima do furto.
Moral da História: Todo louco tem o seu dia de lucidez.
* Essa história é baseada em fatos reais. Os nomes dos envolvidos são fictícios.
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