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LEGISLAÇÕES

terça-feira, 13 de outubro de 2020

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JUSTIÇA LIBERTA UM DOS MAIORES TRAFICANTES BRASILEIROS

 


Ministro do STF já soltou ao menos 79 presos baseando-se na mesma lei.

No final da última sexta-feira (09), o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu um habeas corpus a André Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap, apontado como um dos chefes do Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios de São Paulo, e também considerado como um dos maiores traficantes de drogas do Brasil.

Ele foi libertado no sábado (10), às 11h50, da Penitenciária II de Presidente Venceslau, no interior paulista, onde cumpria duas condenações que, somadas, atingiam 25 anos de prisão.

O traficante saiu pela porta da frente, com o alvará de soltura nas mãos (Foto: Reprodução TV)

Os advogados Anderson Domingues e Áureo Tupinambá afirmaram que seu cliente, em liberdade, iria viver na Baixada Santista. Eles indicaram duas casas, uma em Santos e outra no Guarujá.

Prisão     

Procurado pela Interpol, André do Rap foi preso em setembro de 2019, em uma operação que contou com uma equipe de 23 policiais do Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos (GARRA), do Grupamento de Operações Penitenciárias Especiais e da Divisão Antissequestro (GOPE), da Polícia Civil de São Paulo.

Ele foi encontrado em um condomínio de luxo no bairro Itanema, que fica às margens da BR-101 (Rodovia Rio-Santos), em Angra dos Reis, no litoral do Rio de Janeiro. Na residência, foram apreendidos dois helicópteros, um deles avaliado em cerca de R$ 7 milhões e uma lancha de 60 pés, avaliada em R$ 6 milhões. A casa era alugada, mas ele tinha uma mansão na cidade, fora de um condomínio. Também, segundo o Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), da Polícia Civil, ele é proprietário de um sítio em Bertioga.

LEIA TAMBÉM: A PRISÃO DE ANDRÉ DO REP, APONTADO POR TRAFICAR DROGAS PELO PORTO DE SANTOS

Decisão de Marco Aurélio Mello

Ao conceder o habeas corpus que possibilitou a soltura do réu, o ministro alegou que André estava preso provisoriamente há muito tempo, sem qualquer manifestação da justiça, contrariando a legislação processual brasileira, alterada neste ano, que determina que prisões provisórias sejam revistas a cada 90 dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.

Marco Aurélio soltou ao menos 79 presos baseado na mesma lei (Foto: Rosinei Coutinho/STF)

De acordo com decisão do ministro ele deveria ser solto imediatamente, porque apesar de estar respondendo outro processo, em que foi condenado a 15 anos, 6 meses e 20 dias de prisão, mas no qual ainda não há transitado em julgado da sentença, onde o próprio ministro também já tinha sido concedido um outro habeas corpus concedido a favor dele. O Ministério Público de São Paulo recorreu desse processo.

Justificativa

Marco Aurélio justificou que a prisão é ilegal, e que concedeu a liberdade em virtude da lei aprovada recentemente pelo congresso. Ele afirmou ao site UOL que:

"Se há um ato ilegal na manutenção de uma prisão e chega um habeas corpus a mim, eu devo fechar os olhos?", questionou. "Eu tenho 42 anos de experiência”. “Eu não posso partir para o subjetivismo e critérios de plantão. A minha atuação é vinculada ao direito aprovado pelo Congresso Nacional: ali está a essência do Judiciário", diz.

Suspeição

Segundo a revista Cruzoé, o pedido de soltura de André do Rap foi assinado por Ana Luísa Gonçalves Rocha, sócia de Eduardo Ubaldo Barbosa no Ubaldo Barbosa Advogados, escritório localizado na Asa Norte, em Brasília. Barbosa era assessor no gabinete do ministro Marco Aurélio até 17 de fevereiro deste ano, quando postou em redes sociais uma mensagem de despedida e agradecimento.

Ao fim do ano passado, publicou uma foto no gabinete que contava com a presença do próprio ministro. Procurado pela revista, Marco Aurélio declarou que não tinha conhecimento de quem era a sócia de Barbosa e que a relação não altera na decisão. "Ele (Barbosa) foi meu assessor pessoal e foi advogar", disse. "A mim não altera em nada. Em nada, e absolutamente nada. Nós tivemos no passado uma relação funcional apenas", acrescentou.

Relatora do processo era outra ministra

A autorização para André do Rap deixar o sistema prisional veio do ministro Marco Aurélio Mello, que atendeu a um pedido da defesa e determinou a soltura, no entanto, Rosa Weber é relatora dos processos da operação que prendeu o traficante.

Em despacho proferido em junho, o então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, negou pedido para redistribuir ao colega Marco Aurélio Mello um habeas corpus apresentado pela defesa de um dos presos na Operação Oversea. O argumento usado foi o de que, na Corte, os processos relacionados à operação estão sob relatoria da ministra Rosa Weber.

"A cadeia processual de prevenção a justificar a distribuição deste feito pertence à Ministra Rosa Weber, "relatora dos feitos mais antigos referentes à 'Operação Oversea' em trâmite nesta Corte", escreveu Toffoli.

A operação é a mesma que levou à prisão André do Rap em setembro do ano passado. Por analogia, segundo o princípio da relatoria, é aberta a tese de que a ministra é quem deveria ter decidido sobre a liberdade do suposto líder do Primeiro Comando da Capital (PCC). Isso porque o relator é quem deve se manifestar sobre questões urgentes de um processo, tomar decisões monocráticas e levar ao plenário o julgamento de recursos.

Ministro já concedeu habeas corpus para outros integrantes do PCC

Ministro do STF já soltou ao menos 79 presos baseando-se na mesma lei que favoreceu traficante. O levantamento foi feito pelo G1, que levou em conta apenas decisões publicadas pelo STF .

“O número de pessoas beneficiadas pode ser ainda maior, já que um mesmo habeas corpus pode beneficiar mais de um preso.”

Em todas essas decisões, Marco Aurélio Mello se baseou no artigo 316 do Código de Processo Penal, aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro.

Além de André do Rap, o ministro Marco Aurélio Mello já havia determinado anteriormente a esse caso, a soltura de pelo menos outros dois homens acusados de terem cargos de liderança no PCC: Moacir Levi Correia, o Bi da Baixada (foto), acusado de chefiar o PCC em Santa Catarina, e Odemir Francisco dos Santos, o Branco, que lavava dinheiro para o PCC por meio de uma loja de automóveis, segundo o MP paulista.

Ministério Público já havia solicitado a manutenção da prisão

Na segunda-feira (12), as associações nacionais de Procuradores da República e de promotores de Justiça estaduais divulgaram nota afirmando que tanto o Ministério Público de São Paulo quanto o Ministério Público Federal (MPF) já haviam se manifestado judicialmente pedindo a manutenção da prisão preventiva do traficante André Macedo, conhecido como André do Rap.

"De se ver que, no âmbito das 5ª e 6ª Turma do STJ, foi estabelecido que a obrigação de revisar a manutenção da prisão, a cada 90 dias, é imposta apenas ao juízo de primeiro grau ou tribunal que impôs a medida cautelar, de forma que, proferida sentença ou o acórdão, não mais existiria a obrigação de reavaliar, periodicamente, a renovação da segregação cautelar", diz o texto.

"Importa registrar, ainda, que a inobservância do prazo de prisão preventiva não tem levado à sua automática revogação pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça. Ambos os tribunais vêm decidindo que devem ser analisados os requisitos do caso concreto, que podem justificar a exacerbação do prazo", afirma a nota.

Os integrantes do MP e do MPF alegam, ainda, que a decisão de Marco Aurélio suprimiu uma instância, ao analisar o caso antes que o mesmo pudesse ser analisado pelo STJ.

Em caso idêntico outro ministro teve decisão diferente

O ministro Edson Fachin, do STF, em um caso envolvendo um preso por tráfico no Ceará, com a prisão preventiva decretada em fevereiro do ano passado, negou a solicitação da concessão do habeas baseada  na falta da revisão periódica do juiz

Na decisão esse ministro alegou no seu despacho que não houve excesso de prazo na prisão e que é preciso comprovar o prejuízo sofrido pela ausência da reavaliação no prazo.

"Ao tempo em que reconheço a existência de constrangimento ilegal pela ausência de ato judicial que deveria ser periodicamente realizado, nos termos do art. 316, parágrafo único do Código de Processo Penal (CPP), não visualizo, ao menos no momento, hipótese de nulidade a autorizar a imediata revogação da prisão preventiva", afirmou na decisão.

Presidente do STF suspende habeas corpus

Na noite de sábado (10), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, atendendo um pedido da Procuradoria Geral da República (PGR), suspendeu a decisão liminar (provisória) do ministro Marco Aurélio Mello que determinou a soltura de André do Rap.

Fux determinou a prisão imediata de André do Rap e comunicou com urgência a 5ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Santos, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) e da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo.

Ao pedir ao Supremo o retorno de André do Rap à prisão, o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, afirmou haver "risco efetivo que o paciente em liberdade pode criar à ordem pública”.

Pedido da PGR

Na solicitação de suspensão, o vice-procurado-geral da República afirmou que são “fartas as provas de autoria e materialidade criminosa”, “bem como claras as evidências concretas da necessidade do acautelamento do paciente”.

“A prisão cautelar torna patente que sobre o líder criminoso se impõe a lei, e que seus esquemas de corrupção, cobrança de fidelidade e retribuição por favores já feitos, bem como o arsenal para potencial extorsão e exigência de proteção de agentes políticos não prevalecem perante o movimento da persecução penal”, defendeu Jacques.

“Sabe-se que o crime organizado, nem mesmo com a prisão de seus líderes, é facilmente desmantelado. O que dizer com o retorno à liberdade de chefe de organização criminosa?” questionou o vice-procurador.

“Desbaratar uma organização criminosa é um imperativo da ordem pública. É fundamental garantir a cessação da atividade ilícita e a recuperação do resultado financeiro criminosamente auferido”, completou.

Despacho do presidente do STF

No seu despacho, Fux afirmou que a soltura "compromete a ordem e a segurança públicas", por se tratar de paciente "de comprovada altíssima periculosidade" e com "dupla condenação em segundo grau por tráfico transnacional de drogas".

O ministro diz ainda que o investigado tem "participação de alto nível hierárquico em organização criminosa, com histórico de foragido por mais de 5 anos".

O presidente do Supremo argumentou que, se a soltura for mantida, ela "tem o condão de violar gravemente a ordem pública, na medida em que o paciente é apontado líder de organização criminosa de tráfico transnacional de drogas".

Pedido de prisão foi solicitado antes do habeas corpus

Na sexta-feira (09), antes da sua soltura, o Ministério Público tentou manter a prisão de André do Rap. A promotoria de São Vicente fez um pedido de prisão preventiva, por causa de outro processo em que ele é réu. Os advogados alertaram que André podia fugir do Brasil. Mas o juiz negou o recurso.

"O réu em questão ficou foragido da Justiça por vários anos antes de iniciar o cumprimento de suas penas e, agora, com a determinação citada acima, ficará livre para fugir novamente. Aliás, é da experiência comum que traficantes como o acusado, quando soltos dessa forma, fogem do País sem nem olhar para trás (sic)", escreveu a promotoria.

O juiz Alexandre Torres de Aguiar reconheceu a urgência do pedido, respondendo no mesmo dia, mas indeferiu a prisão preventiva.

"Em que pese a seriedade das informações trazidas pelo Ministério Público, o fato de o réu André Oliveira Macedo ter sido regularmente solto em outros processos, por si só, não se mostra como justificativa suficiente para autorizar um decreto de prisão preventiva nestes autos. Ora, se em casos mais recentes, em que o réu estava preso, já com condenações, teve reconhecido pelo Colendo Supremo Tribunal de Federal o direito de ser solto, não parece razoável pretender seja essa situação revertida, formulando-se pedido de prisão nestes autos, que tramitem desde 2007 e que o réu, repita-se, responde solto desde 2008. Não há elementos atualizados e concretos de que o denunciado efetivamente pode reiterar a conduta criminosa ou que esteja propenso a fugir do distrito da culpa", escreveu o juiz.

Silvio de Cillo Leite Loubeh, promotor que fez o pedido de prisão preventiva, deu entrevista à CNN e afirmou que havia tempo para que André do Rap fosse preso por esse outro processo.

"O pedido foi feito pela promotoria de São Vicente e havia tempo hábil para prisão. Tanto que a decisão foi preferida na véspera da soltura do traficante. No entendimento do MP havia motivo para prisão. E isso foi levado pro juíz de São Vicente, porque era concreto o risco de fuga, como de fato se confirmou muito rapidamente. Inclusive o MP vai tentar o recurso, mas o prejuízo já foi causado", lamentou Silvio.

Fuga

De acordo com o delegado Fabio Lopes, chefe da operação que prendeu André do Rap em 2019, e o promotor Lincoln Gakiya, após deixar a penitenciária, ele não se dirigiu a nenhum dos endereços apontados onde iria permanecer, em Santos e Guarujá. As investigações apontam que o traficante viajou de carro até Maringá, no Paraná, de lá tenha embarcado para o Paraguai.

Na noite de ontem (13), a Polícia Federal pediu a inclusão do nome de André do Rap na lista de procurados da Interpol (Organização Internacional de Polícia Criminal).

Chefe do PCC

André do Rap é acusado pelo Ministério Público do Estado de são Paulo de chefiar, desde fevereiro de 2018, o PCC (Primeiro Comando da Capital) na cidade de Santos, região estratégica para o tráfico internacional de drogas feito pelo PCC.

Até 2018, essa facção criminosa era liderada na cidade por Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, assassinado em fevereiro de 2018, quando tinha 41 anos. Segundo o MP, ele morreu por desviar dinheiro proveniente do tráfico de drogas no Porto de Santos.

Assim como André do Rap, Gegê do Mangue também foi solto por decisão judicial e saiu pela porta da frente do presídio em fevereiro de 2017. Depois, descumpriu todas as determinações da facção e só foi localizado morto no Ceará.

Condenações por tráfico

André do Rap estava preso por duas condenações em segunda instância por tráfico internacional de drogas, com penas que totalizam 25 anos, nove meses e cinco dias de reclusão em regime fechado.

O participação dele num numa quadrilha de tráfico internacional de drogas pelo Porto de Santos foi descoberto em 2013. Investigações da Polícia Federal resultaram nas apreensões de 3,7 toneladas da droga, no país e fora dele, entre janeiro de 2013 e março de 2014.

O Ministério Público Federal ajuizou ações penais para cada uma das apreensões, que denominou de “eventos”. O traficante estava envolvido em dois deles.

Em uma delas, houve a interceptação de 84 kg de cocaína, em 23 de agosto de 2013. A droga seria despachada no navio MSC Vigo para o porto espanhol de Valência

No outro foram apreendidos, em 17 de dezembro de 2013, 145 kg de cocaína que seriam levados no navio MSC Athos ao Porto de Las Palmas, nas Ilhas Canárias, Espanha.

Ligação com a máfia italiana

André do Rap é suspeito de ser o principal elo do PCC com os mafiosos italianos Nicola Assisi, 61, e Patrick Assisi, 37, acusados pelo governo italiano de serem os principais chefes da 'Ndrangheta na América do Sul. Com o nome na lista vermelha da Interpol, eles foram detidos em julho de 2019 na cidade de Praia Grande e estão aguardando processo de extradição no presídio federal de Brasília.

André do Rap e os italianos moravam no mesmo prédio e contrataram o mesmo escritório de advocacia para defendê-los. Para operar no Brasil, a 'Ndrangheta estabeleceu acordos com o PCC.


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